Câmpus São José promove debate sobre a ditadura militar

26. novembro 2014 | Escrito por | Categoria: Câmpus São José, Matérias

SONY DSCAlunos e servidores do Câmpus São José participaram nesta terça-feira (25) de um debate sobre a ditadura militar no Brasil e suas consequências, a partir da apresentação do documentário “História recontada: Marcos Cardoso Filho e a ditadura na Escola Técnica”. Produzido pela IFSCTV e lançado em setembro deste ano, o documentário conta um pouco da história do professor da antiga ETFSC Marcos Cardoso Filho, preso pelo regime militar em 1975 em função de seu envolvimento com o Partido Comunista Brasileiro (PCB).

 


Assista ao documentário

O coordenador da Comissão Estadual da Verdade Paulo Stuart Wright, Anselmo do Livramento Machado, apresentou os principais resultados do trabalho da comissão, criada em 2013 para apurar as violações de direitos humanos ocorridas em Santa Catarina durante o regime militar. No total, a foram identificadas 697 pessoas detidas, a maior parte sem ordem judicial. Nove dos catarinenses presos foram mortos em outros estados. A única morte ocorrida em território catarinense foi a do então prefeito de Balneário Camboriú, Higino João Pio, que morreu sob tortura em 1969 na Escola de Aprendizes Marinheiros, no Estreito, em Florianópolis. Uma das recomendações da comissão, de acordo com Machado, será a capacitação dos professores do ensino médio para a abordagem do tema da ditadura, em disciplinas como História e Sociologia. Os trabalhos da comissão serão encerrados em 18 de dezembro.

Também participaram do debate a psicanalista Laureci Nunes, membro da Escola Brasileira de Psicanálise, a psicóloga Marilena Deschamps Silveira, coordenadora do projeto Clínicas do Testemunho em Florianópolis, e a jornalista do IFSC Ana Paula Lückman, autora do relatório sobre Marcos Cardoso Filho entregue à Comissão da Verdade e integrante da equipe de produção do documentário. O evento, iniciativa do GT de implantação do Centro de Memória, Documentação e Cultura do IFSC, deve ser levado a outros câmpus em 2015. “A perspectiva é que se mantenha o resgate da memória do professor Marcos Cardoso e que se abra esse espaço de debate em toda a instituição”, disse a coordenadora do GT, Sandra Lopes Guimarães.

História

Nascido em Tubarão, em 1950, Marcos Cardoso Filho era engenheiro eletricista formado pela UFSC e começou a dar aulas no curso de Eletrotécnica da ETFSC em abril de 1973. Em 1975, passou a atuar como docente também na UFSC, no Departamento de Engenharia Elétrica – antes, no início dos anos 1970, já havia lecionado Física no Colégio de Aplicação da UFSC e no Instituto Estadual de Educação. Conforme relato de seus familiares, amigos e ex-alunos, Marcos tinha na atividade docente uma de suas grandes paixões.

Apesar de sua aptidão para as ciências exatas, Cardoso Filho também tinha forte inclinação à ciência política e militava, desde o final dos anos 1960, no então proscrito Partido Comunista Brasileiro (PCB). Foi sua atuação como militante que o levou a ser preso na Operação Barriga Verde, deflagrada pelo governo militar ditatorial da época para coibir a reorganização do PCB em Santa Catarina. Julgado em fevereiro de 1978 e condenado a três anos de prisão, o professor deixou a Penitenciária de Florianópolis em abril do mesmo ano, sob liberdade condicional, mas não voltou a dar aulas na ETFSC. Foi demitido pelo então diretor Frederico Guilherme Büendgens, por justa causa, em setembro de 1978. Manteve o vínculo de professor da UFSC até sua morte, em 1983, em decorrência de um acidente de barco que vitimou também seu único filho, Daniel, 4 anos, e outras quatro pessoas.

Produção

O documentário “História recontada: Marcos Cardoso Filho e a ditadura na Escola Técnica” foi produzido a partir do relatório elaborado pelo IFSC por solicitação da Comissão Estadual da Verdade, que, em novembro de 2013, solicitou informações sobre a possível realização do julgamento do professor Marcos nas dependências da antiga Escola Técnica Federal de Santa Catarina (ETFSC).

A equipe responsável buscou documentos antigos – incluindo o processo original da Operação Barriga Verde, no Superior Tribunal Militar, em Brasília -, jornais da época e testemunhas do possível julgamento. Constatou-se que na verdade o que houve na ETFSC foi uma audiência da justiça militar para analisar os pedidos de relaxamento da prisão preventiva de Marcos e de outros réus. Como o número de presos que teriam os pedidos julgados era elevado e a sede da 5ª Circunscrição Judiciária Militar era em Curitiba (PR), optou-se pela vinda dos juízes a Florianópolis, ao invés de transportar todos os presos até o Paraná. A indicação do auditório da ETFSC para o ato foi feita pela Secretaria de Segurança Pública de Santa Catarina. A audiência aconteceu em 22 e 23 de setembro de 1976 e foi testemunhada por vários alunos da escola, inclusive ex-alunos de Marcos.

Em 22 de setembro de 2014, exatos 38 anos após a realização da audiência na ETFSC na qual Marcos era réu, o professor foi homenageado pelo IFSC com o pedido formal de desculpas feito à família, tanto pela exposição do professor perante os alunos na audiência quanto pela demissão por motivação política. No mesmo dia, o auditório da Reitoria passou a chamar-se Auditório Professor Marcos Cardoso Filho e foi lançado o documentário. Familiares, amigos e antigos colegas de militância de Marcos participaram da solenidade.

Tags: ,

Os comenários não estão permitidos.