Pronatec proporciona profissionalização e empoderamento para mulheres
6. março 2015 | Escrito por Jornalismo IFSC | Categoria: MatériasO Brasil é o sétimo país no ranking mundial de crimes contra a mulher, com registro de um espancamento a cada 15 segundos. A indicação sobre a frequência das agressões mostra maior percentual (43,85%) na resposta “apanha todos os dias”, conforme o relatório central do serviço de atendimento disque 180, no período de janeiro a junho de 2014. Nesse contexto, superar estereótipos sobre o papel da mulher na família e na sociedade é ainda um desafio, mesmo quando o atrativo é a profissionalização. É o que constatam profissionais que atuam na modalidade Mulheres Mil do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). Em vários câmpus do IFSC onde o Mulheres Mil é ofertado, uma constatação comum: é preciso abordar cada vez mais os direitos da mulher, indicar acesso à informação sobre organismos de proteção e ampliar o cuidado, o acolhimento a essas pessoas.
Uma pesquisa interna do IFSC, ainda em fase de compilação, mostrou que um terço das 148 respondentes apontaram a violência doméstica como um dos problemas que enfrentam em seu cotidiano. “Mapear o perfil da mulher que frequenta as aulas do Pronatec Mulheres Mil é necessário para verificar se o que oferecemos são os serviços que elas precisam”, diz a assistente social Ania Tamilis da Silva. O questionário mostra, segundo ela, que é preciso enfocar as questões de cidadania e ética, um dos conteúdos do programa voltado à população em vulnerabilidade social. O foco principal é propiciar informações sobre a rede de proteção à mulher, quais os órgãos públicos devem ser procurados e os serviços de assistência com medidas protetivas no caso de denúncia de violência. Coordenadores do programa também convidam profissionais dos órgãos públicos da área de defesa da mulher para palestrar nos cursos e explicar os caminhos a serem seguidos nestas situações.
Os casos de constrangimento vivenciados por algumas das alunas vão desde assédio moral e pressão psicológica até violência física. Além dos próprios relatos pessoais, algumas vezes a intimidação fica visível em situações corriqueiras, como nas explicações para não participação em atividades em horário além do estabelecido para aula. “É uma questão cultural”, avalia Patrícia Rosa, supervisora do Mulheres Mil no Câmpus Gaspar, acrescentando que apenas algumas veem situações desse tipo como violência psicológica.
Segundo Patricia, mulheres que vivem este tipo de relacionamento familiar raramente chegam ao final de seus cursos. Ela defende que, além do resgaste da condição de cidadã, o programa precisa construir a cultura da educação e da profissionalização junto a estas mulheres, inseridas em contexto social muitas vezes com sobrecarga de trabalho numa atividade fixa como trabalhadora da indústria ou doméstica, diaristas e aposentadas, e ainda, na organização de suas próprias casas. “Essa mulher chega à noite cansada e precisa de muita persistência para ainda assistir aulas e aproveitar a oportunidade para aprender um ofício que proporcione uma renda extra”, explica.
Uma das atividades iniciais dos cursos do Pronatec Mulheres Mil é a elaboração de um “mapa da vida” da aluna visando ao reconhecimento da trajetória e perspectiva profissional. Contudo, no exercício, muitas delas trazem questões pessoais e, inclusive, indicam situações de violência. A partir destes relatos o programa verificou a importância de intensificar o assunto nas aulas, e procura oferecer apoio através da indicação dos canais de acesso ao atendimento específico, como delegacias da mulher. Como o tema é recorrente, o programa pretende ampliar o cuidado e tornar sistemático acolhimento a essas pessoas, ao mesmo tempo em que discute cidadania, tanto na disciplina específica, como nas demais. A grade curricular inclui aulas de informática, com exercícios que ensinam como acessar as páginas da Rede de Proteção à Mulher em situação de violência.
No Câmpus Itajaí, um psicólogo acompanha as aulas, o que propiciou um diferencial grande no apoio a mulheres que sofrem violência doméstica, segundo o coordenador Diego Pacheco. A partir dessa participação, algumas alunas solicitaram atendimento com o profissional e foram detectados vários casos de agressão, inclusive graves, e houve orientação para encaminhamento aos órgãos competentes. Para Diego, a proximidade dos profissionais ajuda a encaminhar demandas, já que este público é de vulnerabilidade social e muito suscetível a violência. O coordenador destaca que elas participam atentamente das aulas e depois buscam esclarecer dúvidas em particular com professores e coordenadores. Conforme Diego, a atenção ao problema é um aliado na formação pelo Pronatec, pois melhora o aproveitamento nas aulas específicas. “Elas têm muitas dúvidas e às vezes não denunciam por falta de informações de como proceder, das medidas protetivas à que tem direito. Inclusive alunas egressas vem para ter ajuda ou informação sobre como proceder”, conclui o coordenador.
A modalidade Mulheres Mil teve mais de 4 mil vagas em 16 câmpus do IFSC em 2014. Aos poucos surgem os resultados das formações já oferecidas, como a elevação da autoestima, mudança nas relações familiares, com empoderamento e melhora do desempenho escolar dos filhos, e formalização de empreendimentos para geração de renda. Algumas das alunas começam a romper com a situação de dominação. “Ao trabalhar a autoestima das mulheres, elas passaram a se dar conta do cerceamento de liberdade, e de reconhecer sua própria condição”, afirma Ania. Aos poucos a própria atitude das mulheres muda no relacionamento familiar. Num dos câmpus, as alunas conseguiram trazer os maridos para assistir a uma palestra sobre violência contra a mulher. “Foi uma vitória para elas levá-los a ouvir sobre o assunto”, destaca a assistente social.
Apesar da constatação dos avanços ocorridos, o IFSC pretende realizar levantamento sobre a situação de alunas egressas dos cursos, para ver como estão e verificar como mudou seu cotidiano familiar a partir da formação. Ania vê como desafio avançar sempre mais nesse sentido, na perspectiva de que há um atraso histórico de políticas públicas voltadas para essa problemática social. Segundo ela, o programa é voltado para as mulheres justamente para desmistificar rótulos ligados às questões de gênero, não particularmente as de violência, embora estas sejam as que mais chamem a atenção.
Durante esta e a próxima semana, diversos câmpus do IFSC realizam atividades para lembrar o Dia Internacional da Mulher, celebrado em 8 de março. A programação inclui palestras, oficinas, participação em passeatas e apresentações culturais. As atividades acontecem nos câmpus Canoinhas, Florianópolis-Continente, Itajaí, Joinville, Lages, São José, São Miguel do Oeste e Xanxerê.