Professores do Câmpus Palhoça Bilíngue participam da Surdolimpíada Nacional

17. dezembro 2021 | Escrito por | Categoria: Câmpus Palhoça Bilíngue, Eventos, Matérias

Três professores do Câmpus Palhoça Bilíngue participaram na última semana da Surdolimpíada Nacional, evento realizado em São José dos Campos (SP), representando Santa Catarina. Fabio Irineu da Silva integrou o time de vôlei de quadra, Fabrício Mahler Ramos (terceiro em pé na foto ao lado, da esquerda para a direita) fez parte do time de basquete que conquistou a medalha de prata e Saulo Zulmar Vieira compôs a dupla de vôlei de areia. Organizada pela Confederação Brasileira de Desportos de Surdos (CBDS), a Surdolimpíada Nacional reuniu 740 atletas de todo o país para a disputa de 15 modalidades.

O evento foi preparativo para a convocação final das Seleções Brasileiras para a Deaflympics, olimpíadas para atletas surdos, que será realizada em Caxias do Sul (RS), em maio de 2022. As equipes de Santa Catarina que disputaram a competição foram organizadas pela Federação Desportiva de Surdos do Estado de Santa Catarina (FDSESC).

Os professores Fabio e Fabrício contam a seguir como foi a experiência de participar das Surdolimpíadas e o que o esporte traz de benefícios para eles e para as pessoas surdas, além de contar um pouco sobre a história das competições para atletas surdos. As respostas de Fabio foram enviadas por texto (e-mail) e as de Fabrício foram por meio de vídeos em língua brasileira de sinais (Libras) que foram traduzidos para a língua portuguesa pelo tradutor-intérprete Tom Min Alves, também do Câmpus Palhoça Bilíngue.

Pergunta: Como foi para você a experiência de participar de uma competição como a Surdolimpíada? Foi a primeira vez que participou?

Fabio: Foi a segunda vez que participei. A primeira foi em 2019 e agora em 2021. A participação na Surdolimpíada é uma experiência muito gratificante. Ver tantos surdos juntos, interagindo e se comunicando livremente é muito emocionante, traz uma sensação muito boa de pertencimento. Apesar da minha equipe não trazer medalha neste ano, a participação de SC [Santa Catarina] foi muito boa. O que atrapalhou um pouco é essa situação de pandemia, o uso de máscaras, a preocupação constante de estar distanciado e manter a higienização. Mas, no geral, foi uma experiência que desejo para todos os surdos.

Fabrício: Já em 2002, nós tivemos em Passo Fundo, cidade do Rio Grande do Sul, a primeira Surdolimpíada e eu participei do basquete. Meu time, do Rio Grande do Sul, ganhou o primeiro lugar – eu sou gaúcho, mas mudei aqui para Santa Catarina já faz cinco anos, mais ou menos. Eu acredito que eventos como a Surdolimpíada são importantes porque surdos de muitos estados se encontram, se conhecem, e isso é muito importante para a gente. Mas temos ouvintes participando também dos eventos, como administradores ou juízes. A gente ganha mais visibilidade com esses eventos. Esses eventos sempre aconteceram com dinheiro particular. A gente faz churrasco, rifas, temos algumas estratégias para arrecadar dinheiro e poder fazer viagens e realizar os jogos. Mas nunca foi bancado pelo governo. Nós já tivemos três edições: a de Passo Fundo em 2002, a de Pará de Minas, em Minas Gerais, em 2019, e agora em 2021 foi em São José dos Campos.

Pergunta: O que o esporte trouxe de bom para você?

Fabio: Para mim trouxe autoestima, saúde, desenvolvimento cultural, amizades, fortalecimento da minha identidade como pessoa surda que utiliza a língua de sinais como primeira língua. Só tenho coisas positivas para recordar, por isso, procuro incentivar os jovens surdos na prática do voleibol para que eles possam se valorizar, fazer escolhas saudáveis para o corpo e a mente.

Fabrício: Medalha (risos)! Bom, eu trouxe uma medalha para Santa Catarina. Eu ganhei uma medalha no Rio Grande do Sul e a gente ganhou, mas, agora a primeira vez jogando por Santa Catarina também foi uma experiência excelente. A equipe jogou bem entrosada e a gente ficou em segundo lugar. Eu gostaria que na próxima Surdolimpíada tivesse investimento do governo, que eles bancassem os jogos. Essa última edição eles ajudaram no transporte e hospedagem com verba pública, mas alimentação foi por nossa conta. É bastante dispendioso organizar esses jogos. Eu tenho esperança de que futuramente a gente tenha investimento em atletas surdos. É importante que nos preparemos, porque em breve teremos a Deaflympics, que é um evento internacional e vai acontecer aqui em Caxias do Sul, no Brasil, em maio. Então, não sei se vou participar da Seleção Brasileira, mas eu já participei de uma [Deaflympics] anterior, na Itália.

Pergunta: Por que é importante para os surdos praticar esportes?

Fabio: Foi e ainda é por meio do esporte que muitos surdos se autoconheceram, encontraram a liberdade de se comunicar, compreenderam o valor da união e dos valores culturais. Aprendemos através do esporte a lutar pelos nossos direitos, principalmente pelo acesso às informações. A Surdolimpíada é um evento muito importante e tradicional das comunidades surdas mundiais. Já acontece no mundo desde 1924. No Brasil passou a acontecer a etapa nacional a partir de 2002. Esses encontros fazem a língua de sinais e a cultura surda se desenvolverem e se fortalecerem. No entanto, ainda há pouco apoio aos atletas surdos. Estimo que 99% não conseguem se profissionalizar no esporte por falta de recursos e a participação nos treinos e eventos como a Surdolimpíada é bastante complicada por terem que solicitar dispensa no trabalho. Muitas empresas não conhecem e não apoiam essas participações. Com os resultados da Surdolimpíada Nacional de 2021, espero poder incentivar ainda mais os jovens surdos para marcarem presença em 2023.

Fabrício: Bom, muitos surdos praticam esportes. Talvez a pergunta fosse: “o que as pessoas ouvintes pensam sobre surdos que praticam esporte?”. Eu cresci fazendo esporte e sou formado em Educação Física. Sempre participei de times com surdos, em basquete vôlei, futebol. Todos os esportes são possíveis. Mas por que isso é importante? Acho que faz parte do currículo escolar. A Surdolimpíada, assim como a Deaflympics e a escola são muito importantes para surdos, assim como a escola e o esporte são importantes para os ouvintes. A gente percebe que tem surdos que são atletas profissionais, mas geralmente os clubes – os de futebol, por exemplo – contratam ouvintes. Eles não contratam surdos. O surdo é completamente capaz. Ele joga com os olhos e temos times já que contrataram jogadores surdos. Mas muitas vezes os clubes optam por contratar apenas profissionais ouvintes. É importante que os ouvintes entendam que o surdo é capaz de se tornar um atleta, de trabalhar com isso, da mesma forma que um ouvinte. O que falta talvez é mais visibilidade para nós surdos e um evento como a Surdolimpíada tem também esse papel. A gente busca também verba para poder ter mais visibilidade e continuar os jogos.

Por Felipe Silva | Jornalista do IFSC

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